A recente decisão da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) validando a cobrança de Imposto de Renda (IR) em conjunto com o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) sobre a transferência de imóveis oriundos de heranças ou doações levanta questionamentos relevantes sobre a constitucionalidade dessa incidência dupla. O fundamento central da decisão é que o ganho de capital apurado na transferência de bens configura acréscimo patrimonial, justificando a tributação pelo IR, além do ITCMD devido na transmissão.
Neste artigo, apresentamos uma análise crítica dessa decisão, argumentando pela ilegalidade e inconstitucionalidade dessa cobrança com base em princípios constitucionais e na própria natureza dos tributos envolvidos.
Fundamentação Jurídica: Diferença entre Fatos Geradores
O argumento do STF para validar a cobrança dupla é que os fatos geradores do IR e do ITCMD são distintos:
- ITCMD: Incide sobre a transmissão da propriedade, sendo de competência dos estados, conforme o artigo 155, inciso I, da Constituição Federal.
- IR: Incide sobre o acréscimo patrimonial decorrente do ganho de capital apurado na transferência de bens.
Contudo, essa interpretação desconsidera um princípio essencial do direito tributário: a vedada bitributação, que ocorre quando a mesma realidade econômica é tributada por diferentes entes federativos ou tributos.
A Cobrança de IR Configura Bitributação?
Natureza do Ganho de Capital em Transmissões Gratuitas
No caso de transmissões patrimoniais por herança ou doação, não há, de fato, acréscimo patrimonial para o falecido ou para o doador. A transferência é feita a título gratuito, representando uma diminuição patrimonial para quem transfere os bens. A interpretação de que a apuração de ganho de capital no espólio justifica a incidência do IR deturpa a essência econômica da operação.
O ITCMD, por sua vez, é o tributo constitucionalmente designado para abarcar essa transferência de titularidade patrimonial. Ao permitir que o IR também incida, cria-se uma situação de sobreposição tributária.
Princípios Constitucionais Violados
A decisão do STF afronta princípios fundamentais do sistema tributário brasileiro:
- Vedada Bitributação: O artigo 150, inciso I, da Constituição proíbe que diferentes entes federativos tributem a mesma matéria.
- Competência Tributária: A Constituição atribui exclusivamente aos estados a competência para tributar transmissões patrimoniais gratuitas por meio do ITCMD.
- Princípio da Capacidade Contributiva: A incidência do IR sobre ganho de capital em transmissões gratuitas desconsidera que não houve um acréscimo real na riqueza do contribuinte, o que é essencial para configurar capacidade contributiva.
Lei 9.532/1997: Definição de Fato Gerador e Inconstitucionalidade
O STF argumentou que a Lei 9.532/1997 apenas especificou o momento de incidência do IR no caso de ganho de capital em transmissões hereditárias ou por doação. Contudo, o artigo 23, §1º, da referida lei ultrapassa os limites da legislação infraconstitucional ao criar uma nova hipótese de incidência tributária.
Ao impor a apuração do ganho de capital em transmissões gratuitas, a lei interfere na competência estadual de tributar essas operações por meio do ITCMD, configurando invasão de competência.
Consequências para os Contribuintes
A validação da cobrança dupla traz impactos significativos para os contribuintes, que passam a suportar uma carga tributária desproporcional em operações de transmissões patrimoniais gratuitas. Essa decisão abre precedentes perigosos para que novas situações de bitributação sejam admitidas.
Conclusão
A decisão do STF de validar a cobrança de IR sobre o ganho de capital em transmissões patrimoniais gratuitas, mesmo em conjunto com o ITCMD, é juridicamente controversa e afronta princípios constitucionais como a vedada bitributação e a capacidade contributiva. A interpretação de que o IR incide sobre acréscimo patrimonial em operações como heranças e doações ignora a verdadeira natureza econômica dessas operações, que não configuram aumento de riqueza.
Os contribuintes devem estar atentos a essa decisão e buscar assessoria jurídica para avaliar as melhores estratégias de planejamento patrimonial e tributário, minimizando os impactos dessa cobrança.
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