Reforma Tributária e o Produtor Rural: O Novo Cenário da Tributação no Campo

Reforma Tributária e o Produtor Rural: O Novo Cenário da Tributação no Campo

A paisagem fiscal do agronegócio está prestes a mudar. A aprovação da Lei Complementar nº 214/2025, que regulamenta a tão discutida reforma tributária, trouxe um novo capítulo para o setor rural. E ele exige atenção, estratégia e, acima de tudo, preparo.

Durante décadas, o produtor rural — especialmente aquele de pequeno ou médio porte — esteve, em grande parte, à margem da tributação sobre consumo. Isso acontecia porque tributos como o ICMS, o PIS e a Cofins eram recolhidos pela revenda ou pela indústria, por meio do sistema de substituição tributária ou de diferimento. Na prática, o produtor sentia pouco ou quase nenhum impacto desses tributos em sua rotina.

Mas esse cenário está mudando — e rápido.

O que a reforma muda para o produtor rural?

Com a substituição de diversos tributos por dois impostos principais — o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) —, o produtor rural passa a ser incorporado ao sistema de tributação sobre consumo. Conforme o artigo 164 da LC 214/25, os produtores com receita bruta anual superior a R$ 3.600.000,00 se tornam contribuintes obrigatórios do novo sistema.

Embora a Lei não estabeleça uma alíquota fixa para o setor agropecuário, especialistas do mercado projetam uma carga tributária em torno de 11% sobre a receita bruta. Essa projeção considera uma média entre o débito de IBS/CBS sobre a receita e os créditos permitidos com base nas aquisições de insumos agropecuários, conforme os artigos 47 a 56 da LC 214 e o diferimento previsto no artigo 138.

Contudo, é importante destacar que essa alíquota efetiva poderá variar conforme o tipo de insumo utilizado, a organização da produção e o aproveitamento correto dos créditos tributários. Logo, o produtor deve estar atento à regulamentação futura, que definirá, inclusive, quais itens são considerados insumos geradores de crédito.

Exemplo prático: A conta do novo tributo

Vamos imaginar um produtor que fatura R$ 2.000.000,00 com a venda de soja.

  • Se a alíquota combinada de IBS e CBS for de 11%, ele terá um débito de R$ 2200.000,00 a pagar.
  • No entanto, se tiver comprado R$ 1.000.000,00 em insumos tributados (sementes, fertilizantes, defensivos, diesel etc.), poderá gerar um crédito de R$ 110.000,00, abatendo do imposto devido.
  • O resultado: tributação efetiva de R$ 110.000,00, ou 5,5% sobre sua receita.

Mas atenção: nem todo insumo dá direito ao crédito. A LC 214 define quais insumos geram crédito, e essa lista será fundamental para evitar surpresas no caixa.

E os pequenos produtores? Estão livres?

A princípio, sim. De acordo com o próprio artigo 164 da nova lei, produtores com receita bruta inferior a R$ 3,6 milhões por ano não são contribuintes obrigatórios do IBS e da CBS. Mas isso não significa que sairão ilesos dos impactos.

A razão é simples: para as indústrias e revendas, comprar de produtores que não geram crédito claro pode ser um problema. Esses compradores passarão a preferir negociar com quem esteja no regime tributário completo, pois assim conseguem aproveitar créditos plenos e diretos, em vez de créditos presumidos, cuja validade pode ser mais limitada e sujeita a regras específicas (art. 168 da LC 214/25).

Resultado? O pequeno produtor pode acabar sendo preterido — não por sua qualidade ou preço, mas por um efeito colateral do novo sistema tributário.

Indústria e revenda: quem já estava preparado

Para a indústria e os distribuidores do agro, a mudança será mais leve. Isso porque essas empresas já lidam com apuração de tributos, escrituração eletrônica e planejamento fiscal. A entrada no novo sistema exigirá adaptação, sim, mas dentro de um ambiente já estruturado.

O verdadeiro desafio recai sobre os produtores que nunca precisaram pensar em livros fiscais, créditos tributários, documentos eletrônicos com detalhamento de alíquotas e escrituração digital. Para esses, a curva de aprendizado será mais íngreme — e o custo da inércia, mais alto.

Crédito presumido para o adquirente (não para o produtor):

Quando o produtor rural não é contribuinte, o comprador de seus produtos (como cooperativas, agroindústrias ou distribuidores) pode se apropriar de crédito presumido (Art. 168). Esse crédito será calculado com base em percentuais divulgados anualmente (Art. 168, § 4º). Esses percentuais funcionam como forma de compensar a impossibilidade de crédito normal quando se compra de produtor não contribuinte.

Regime facultativo e planejamento

A LC 214/25, nos artigos 165 e 166, abre uma possibilidade importante: mesmo os produtores abaixo do limite de R$ 3,6 milhões podem optar por aderir ao regime regular, passando a ser contribuintes plenos do IBS e da CBS. Isso pode ser uma estratégia inteligente para quem quer aumentar a competitividade e manter mercado com grandes compradores.

Contudo, essa decisão precisa ser tomada com planejamento contábil e jurídico, pois a adesão é irretratável durante o ano-calendário, e exige estrutura para controle fiscal eficiente.

Como se preparar?

A melhor colheita é aquela que começa com um bom preparo do solo. E quando o assunto é tributo, a lógica é parecida. Aqui estão os primeiros passos para o produtor que quer prosperar nesse novo ambiente tributário:

  1. Converse com seu contador ou busque uma consultoria especializada em tributos do agro.
  2. Mapeie todos os seus custos de produção e descubra quais insumos são creditáveis.
  3. Avalie se vale a pena aderir ao regime facultativo, mesmo que sua receita ainda seja inferior ao limite.
  4. Fortaleça seus canais de venda, buscando diversificar compradores e evitando a dependência de apenas um perfil de cliente.
  5. Atualize sua gestão fiscal e tecnológica, adotando sistemas que ajudem na emissão de documentos fiscais eletrônicos e apuração correta do tributo.

O campo está mudando. Quem planta preparo, colhe vantagem.

A reforma tributária está longe de ser apenas uma mudança de siglas e alíquotas. Para o agro, ela representa uma virada de chave na forma como o setor se relaciona com o fisco. Produtores que antes viviam numa zona de conforto tributária agora precisarão desenvolver uma nova habilidade: a gestão tributária eficiente.

Mas nem tudo são pedras no caminho. Para quem se adapta, essa nova fase também representa uma chance de se profissionalizar, crescer e acessar novos mercados.

Seja você um pequeno produtor que vende direto na fazenda ou um grande exportador de grãos, uma coisa é certa: o futuro tributário do campo já começou. E nele, quem mais prospera é quem melhor se antecipa.

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