O sistema tributário brasileiro, além de complexo e inseguro, gera uma alta carga tributária para as empresas. Esta complexidade gera em muitas ocasiões a cobrança de tributos de forma contrária a Constituição Federal. Em outras palavras, os contribuintes pagam tributos de forma indevida.
À título de exemplo de cobrança de tributos inconstitucionais, podemos citar a cobrança da contribuição a outras entidades ou mais comumente chamadas de contribuições ao “sistema s”, sobre base de cálculo acima de 20 salários.
As mencionadas contribuições ao “sistema s” referem-se às contribuições a outras entidades/terceiros (INCRA, Salário Educação, SESC, etc.)
A respeito desta inconstitucionalidade, é importante mencionar que o percentual pago a título de contribuições ao “sistema s”, é em média, dependendo do segmento do contribuinte, é de 5,8% sobre o valor da folha de pagamento. Assim, se sua empresa paga 100 salários mínimos de folha de pagamento mensal, ela poderá, sobre os 80 salários deixar de pagar 5,8%.
Para fins de conhecimento do leitor, o artigo 149 da CR/88 estabelece três espécies de contribuições sociais. Elas são denominadas pelo STJ como “contribuições parafiscais recolhidas pelo INSS por conta de terceiros”, sendo elas:
1) as contribuições sociais em sentido estrito (Salário Educação);
2) contribuições de intervenção no domínio econômico (INCRA)
3) contribuições de interesse das categorias profissionais ou econômicas.
Anteriormente a promulgação da CF/88, o artigo 151 da Lei nº 3.807/60 delegou às instituições da Previdência Social a arrecadação das demais contribuições. Inclusive aquelas devidas a outras entidades/terceiros (sistema s).
Posteriormente, entrou em vigor a Lei nº 5.890/73, fixando o limite de 10 (dez) vezes do salário mínimo vigente no país, como base de cálculo (máxima) das contribuições de terceiros. Vejamos:
Art. 14 As contribuições arrecadadas pelo Instituto Nacional de Previdência Social das empresas que lhes são vinculadas, e destinadas a outras entidades ou fundos, serão calculadas sobre a mesma base utilizada para o cálculo das contribuições de previdência, estarão sujeitas aos mesmos prazos, condições e sanções e gozarão dos mesmos privilégios a ele atribuídos, inclusive no tocante à cobrança judicial, não podendo o cálculo incidir sobre importância que exceda de 10 (dez) vezes o salário-mínimo mensal de maior valor vigente no País.
Em seguida, foi aprovada a Lei nº 6.950/81 que estabeleceu, no “caput” do artigo 4º, que o limite máximo do salário de contribuição seria correspondente à 20 vezes o salário mínimo vigente no país. Porém, ainda no parágrafo único do mesmo artigo ficou determinado que o referido limite, aplica-se às contribuições parafiscais arrecadadas por conta de terceiros. Vejamos:
Art. 4º O limite máximo do salário-de-contribuição, previsto no art. 5º da Lei nº 6.332, de 18 de maio de 1976, é fixado em valor correspondente a 20 (vinte) vezes o maior salário-mínimo vigente no País.
Parágrafo único – O limite a que se refere o presente artigo aplica-se às contribuições parafiscais arrecadadas por conta de terceiros.
Posteriormente, foi novamente alterada a questão através do artigo 3º do Decreto Lei nº 2.318/86, retirando o limite da contribuição previdenciária de 20 vezes o salário mínimo vigente. Vejamos:
Art. 3º Para efeito de cálculo da contribuição da empresa para a previdência social, o salário de contribuição não está sujeito ao limite de vinte vezes o salário mínimo, imposto pelo art. 4º da Lei nº 6.950, de 4 de novembro de 1981.
Analisando a citada norma, é possível concluir que a revogação expressa do limite se deu exclusivamente para a contribuição previdenciária patronal. Em outras palavras, apenas para a contribuição social, não sendo possível estender tal revogação para as contribuições parafiscais.
A análise da legalidade da cobrança de contribuições ao “sistema s” no valor de sobre uma base de cálculo superior a 20 vezes o salário mínimo parte da premissa de analisar se houve ou não a revogação, pelo Decreto Lei nº 2.318/86, do limite de 20 (vinte) salários para base de cálculo das contribuições parafiscais.
Para aferir a revogação ou não do parágrafo único do art. 4º da Lei nº 6.950/81 pelo artigo 3º do Decreto Lei nº 2.318/86, é necessário se ater ao que rege o artigo 2º e parágrafos da LICC.
O art. 2o determina que não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou a revogue, ou seja, revogação expressa. Em complemento, o parágrafo primeiro deste dispositivo, determina que a lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare (revogação expressa), quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior (revogação tácita).
Por fim, o parágrafo segundo estabelece que a lei nova estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revogando nem modificando a lei anterior.
Com base na análise literal destes dispositivos, podemos concluir que pelo fato do artigo 3º do Decreto Lei nº 2.318/86 ter sido expresso ao afastar o limite de 20 salários mínimos com base de cálculo das contribuições previdenciária patronais, não há que se falar em afastamento do limite no que diz respeito as contribuições ao “sistema s” (outras entidades).
Cabe mencionar que existem alguns precedentes de Tribunais Regionais Federais que entendem que o parágrafo único do art. 4º da Lei nº 6.950/81 foi revogado, tacitamente, pelo §5º do art. 28 da Lei nº 8.212/91. Este entendimento não tem base literal, pois §5º do art. 28 da Lei nº 8.212/91 não trata de base de cálculo de contribuições parafiscais e sim de valor de salário-contribuição.
Para dar alicerce a estes fundamentos, cabe mencionar o entendimento de alguns tribunais superiores:
“EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. COISA JULGADA. INEXISTÊNCIA. INCRA E SALÁRIO-EDUCAÇÃO. LIMITE DA BASE DE CÁLCULO. HONORÁRIOS. 1. Os efeitos da coisa julgada atingem apenas os lançamentos administrativos objetos de apreciação judicial, não fazendo coisa julgada em relação a outros lançamentos, mesmo versando estes sobre a mesma matéria. 2. A base de cálculo das contribuições parafiscais recolhidas pelo INSS por conta de terceiros se submete ao limite de 20 salários-mínimos, por força do parágrafo único, do art. 4º da Lei 6.950/81. O art. 3º do Decreto-Lei n.º 2.318/86 não logrou alterar tal limite, pois dispõe apenas sobre as contribuições sociais devidas pelo empregador diretamente à Previdência Social. 3. A fixação dos honorários advocatícios em 10% da valor da causa implica redução da verba honorária arbitrada pelo Juízo a quo. Sentença mantida, sob pena de reformatio in pejus.” (TRF4, APELREEX 1999.04.01.049035-4, PRIMEIRA TURMA, Relator JOEL ILAN PACIORNIK, D.E. 22/09/2010).
“AGRAVO INTERNO. TRIBUTÁRIO. SALÁRIO-EDUCAÇÃO. CARÁTER TRIBUTÁRIO DA EXAÇÃO. AUSÊNCIA DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E DA ANTERIORIDADE. BASE DE CÁLCULO. LIMITE. REVOGAÇÃO APENAS PARA CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS DEVIDAS PELAS EMPRESAS. CONTRIBUIÇÕES A TERCEIROS. LIMITE PRESERVADO. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO IMPROVIDO.
(…) 7. No tocante à arrecadação, nos termos do art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 6.950/81, foi estabelecido limite máximo para base de cálculo das contribuições parafiscais. No entanto, sobreveio o Decreto-Lei nº 2.318/86, com disposição que retirou o limite para o cálculo da contribuição da empresa. Assim, ocorreu expressa revogação do limite apenas para as contribuições previdenciárias devidas pelas empresas, preservando-se o limite somente para as contribuições a terceiros. Neste sentido, correta a r. sentença apelada, ao ressaltar que, a Lei nº 9.426/96 constitui-se no diploma regulador específico do salário-de-contribuição, de modo que a Lei nº 6.950/81, que cuidava unicamente de alterar a legislação previdenciária, não se pode sobrepor aos ditames da nova lei, posterior e específica, até porque suas disposições, na questão em foco, são eminentemente conflitantes com a nova regra.
8. A decisão monocrática recorrida encontra-se adrede fundamentada. De qualquer sorte a matéria debatida nos autos já foi devidamente dirimida, sendo, inclusive objeto da Súmula n° 732 do Supremo Tribunal Federal e do RE n° 660.993-RG (DJe 22/02/2012), apreciado no regime da repercussão geral. 9. Não há elementos novos capazes de alterar o entendimento externado na decisão monocrática. 10. Agravo interno improvido.” (TRF3 – APELAÇÃO CÍVEL – 1917527/SP, 0009810-15.2011.4.03.6104, Relator(a) DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA, SEXTA TURMA, Data do Julgamento 13/12/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/01/2019).
Além disso, é possível verificar que existem decisões favoráveis aos contribuintes no Superior Tribunal de Justiça, nos autos do Recurso Especial nº 1.241.362/SC:
“TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÃO ADICIONAL DEVIDA AO SENAI. Será calculada sobre a importância da contribuição geral devida pelos empregadores ao SENAI a contribuição adicional de 20%, na forma do art. 1º do Decreto-Lei 4048/42, a que se refere o art. 6º daquele diploma legal. II – A contribuição geral, base de cálculo encontra-se regulada no art. 1º do Decreto nº 1867/81 e incide até o limite máximo das exigências das contribuições previdenciárias e este limite corresponde a 20 vezes o maior salário mínimo vigente no País (art. 4º, Lei 6.950/81) III – Apelação improvida, sentença confirmada.”
Por fim, e mais importante, o Superior Tribunal de Justiça que desde 2008 só se posicionava sobre o assunto por meio de decisões de um único ministro (monocráticas), decidiu através da Primeira Turma, ser favorável aos contribuintes, determinando a limitação de 20 salários mínimos como base de cálculo do salário-educação, e das contribuições destinadas a entidades como as do “sistema s” e o Incra.
Por unanimidade, o entendimento dos ministros permitiu que a indústria química Rhodia Brasil possa reduzir a carga tributária sobre a folha de pagamento.
Com base nos precedentes, na decisão da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça e na fundamentação legal exposta alhures, cabe concluir que o limite do salário de contribuição parafiscais estabelecido no parágrafo único do art. 4º da Lei nº 6.950/81, encontra-se plenamente em vigor, vez que inexiste revogação expressa ou tácita dele. Em outras palavras, não há que se falar em revogação do referido limite pelo advento do Decreto Lei nº 2.318/86.
Com base nestes fundamentos e precedentes, cabe concluir que as empresas, optantes pelo recolhimento de imposto de renda pelo lucro presumido ou pelo lucro real, que possuam folha de salário mensal superior a 20 salários mínimos, podem estar pagando tributos indevidamente e com isto tem impostos a restituir.
Em outras palavras, se sua empresa se enquadra na situação exposta no parágrafo anterior, poderá reduzir o valor a pagar a título de contribuições ao “sistema s”, bem como poderá requerer a restituição dos valores pagos nos últimos 5 anos!
Assim, visando evitar perda de lucro e prescrição do crédito tributário, os contribuintes, que se enquadram nesta situação, deverão ingressar na justiça requerendo a suspenção da exigibilidade de contribuições ao “sistema s” sobre base de cálculo superior a 20 salários mínimos, bem como a restituição dos pagamentos indevidos dos últimos 5 anos.
Sobre esta questão, a equipe da Reduza Tributos é formada por advogados tributaristas, contadores e consultores que se colocam à disposição para analisar seu caso e dar as melhores alternativas para recuperação de crédito e redução da carga tributária da sua empresa.
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