A Reforma Tributária brasileira, consolidada pela Lei Complementar nº 214/2025, traz uma série de inovações não apenas na estrutura dos tributos, mas também na forma como suas alíquotas serão calibradas ao longo do tempo.
Um dos conceitos centrais introduzidos é o das “alíquotas de referência” — mecanismos criados para assegurar o equilíbrio da arrecadação entre União, Estados e Municípios, mesmo diante de mudanças legislativas futuras.
Compreender como essas alíquotas funcionarão é essencial para contadores, empresários, investidores, gestores públicos e todos aqueles que desejam interpretar corretamente os efeitos econômicos da nova tributação.
Vamos detalhar a seguir para melhor orientá-los.
O Que São Alíquotas de Referência?
As alíquotas de referência são valores fixados anualmente, destinados a servir como padrão para cálculo da arrecadação do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços).
Elas não são alíquotas “livres” ou flexíveis a bel-prazer de cada ente federativo. Pelo contrário: representam uma tentativa de garantir previsibilidade, estabilidade arrecadatória e neutralidade fiscal, evitando que alterações legislativas futuras desequilibrem a partilha de receitas públicas.
Quem Fixa as Alíquotas de Referência?
Segundo o Art. 18 da LC 214/25, caberá ao Senado Federal fixar as alíquotas de referência por meio de resolução:
- Para a CBS: a partir de 2027 até 2035;
- Para o IBS: de 2029 a 2035;
- Após 2035: as alíquotas de referência vigentes serão as mesmas do ano anterior, até eventual nova deliberação.
Esta previsão confere ao Senado um papel crucial como árbitro da manutenção do equilíbrio federativo no novo modelo tributário.
Como Funciona a Atualização das Alíquotas?
A grande inovação trazida pela lei é o estabelecimento de um procedimento claro para ajustes obrigatórios das alíquotas de referência sempre que houver:
- Aumento ou redução de arrecadação potencial do IBS ou da CBS;
- Alterações legais que impactem regimes diferenciados, devoluções de tributos para pessoas físicas ou mudanças estruturais no Simples Nacional e no MEI.
Essa sistemática está prevista no Art. 19 e busca blindar o sistema de pressões políticas de curto prazo, exigindo que:
- Sempre que uma alteração legislativa afetar a arrecadação, um ajuste proporcional na alíquota de referência será obrigatório.
- A alteração legislativa só poderá produzir efeitos após o ajuste da alíquota pelo Senado.
- O ajuste deve ser calculado tecnicamente, com base em estudos elaborados:
- Pelo Comitê Gestor do IBS;
- Pelo Poder Executivo Federal;
- E homologados pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
Este processo inclui prazos rigorosos para elaboração, ajustes e homologações, tudo para garantir segurança jurídica e respeito ao pacto federativo.
Procedimento Técnico de Ajuste
O detalhamento do procedimento é minucioso:
- 60 dias após a promulgação da lei que impacte a arrecadação, o Comitê Gestor e/ou o Executivo deverão apresentar cálculos e metodologia ao TCU;
- O TCU terá 60 dias para validar ou solicitar ajustes;
- O Comitê Gestor/Executivo terá 30 dias para corrigir, se necessário;
- O TCU decidirá definitivamente em mais 30 dias e enviará ao Senado;
- O Senado terá 30 dias para editar a resolução de ajuste das alíquotas.
Além disso, alterações só podem entrar em vigor respeitando:
- A anterioridade nonagesimal (90 dias);
- E, para o IBS, também a anterioridade anual (só no exercício seguinte).
Quais Alterações Devem Gerar Ajuste?
Segundo o §1º do Art. 19, qualquer modificação que aumente ou reduza a arrecadação do IBS ou CBS precisa ser compensada, incluindo:
- Mudanças nas regras de devolução de tributos para pessoas físicas (cashback);
- Ampliação ou restrição de regimes diferenciados (educação, saúde, agronegócio, etc.);
- Alterações no tratamento tributário do Simples Nacional e do MEI.
Entretanto, não geram ajuste:
- Mudanças meramente na alíquota da CBS previstas no Art. 14, §2º;
- Alterações no montante específico de devolução da CBS para pessoas físicas.
Exigência para Novos Projetos de Lei
Ainda, pelo Art. 20 da LC 214/25, qualquer novo projeto de lei que pretenda alterar a arrecadação do IBS ou da CBS só poderá ser analisado pelo Congresso se já vier acompanhado de:
- Estimativa de impacto sobre as alíquotas de referência;
- Metodologia utilizada para projeção do impacto;
- Manifestação prévia do Poder Executivo ou do Comitê Gestor do IBS.
Essa medida torna o sistema mais técnico, exigindo responsabilidade fiscal explícita antes de qualquer alteração, e reforça a blindagem do equilíbrio federativo.
Resumo: O Papel Central da Alíquota de Referência
Em resumo, no novo sistema tributário:
- As alíquotas de referência atuarão como guardião do equilíbrio arrecadatório;
- Alterações legislativas que afetem a arrecadação só poderão entrar em vigor após a devida compensação;
- O Senado Federal será o árbitro técnico das mudanças, com apoio do Executivo, do Comitê Gestor e do Tribunal de Contas da União.
Trata-se de uma construção complexa, mas necessária para assegurar que a Reforma Tributária não seja desfigurada ao longo dos anos por pressões políticas ou por desequilíbrios fiscais regionais.
Conclusão: Estabilidade e Previsibilidade para o Novo Sistema Tributário
A criação das alíquotas de referência representa um avanço sofisticado no controle do sistema tributário nacional.
Ela visa garantir que o novo modelo de IBS e CBS seja estável, previsível e justo — e que qualquer benefício concedido de um lado seja devidamente compensado do outro.
Para empresas, advogados tributaristas, contadores e gestores públicos, compreender essa dinâmica será essencial para interpretar o comportamento futuro dos tributos e planejar estrategicamente suas operações no novo cenário.
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